sábado, 21 de junho de 2008

Avisos insólitos aos navegantes: fora, porcalhões


Sujismundos, tremei! De frio ou medo. Em uma rua do bairro San Blás, em Cusco, Peru, vizinhos em fúria pregaram esse cartaz no muro, onde advertem sobre o castigo para quem insistir em jogar lixo ou fazer cocô na via pública: prisão ou um balde de água fria na cabeça.

Amigos sem fronteira


Sábado passado me enfiei num ônibus às 23h15 para Campinas. Foram quase sete horas de travessia insone. Cheguei às 5h40 de domingo com as olheiras ainda mais escuras, e trêbada de sono. Voltei para casa 30 horas depois. Cansada, mas feliz. Fui dar um abraço numa amiga que vai morar nos Estados Unidos. A maratona me fez lembrar de uma das coisas mais bacanas que já fiz na vida.

Em outubro de 2004, tentava curar a ressaca de Madri. Meu corpo estava no Rio, mas a cabeça deixei na Rua Marqués de Lozoya. Foi nesse endereço que cumpri o último rito de passagem de filha para mulher independente: tive que aprender a me virar nas tarefas domésticas, não sem antes tingir minhas meias e blusas brancas de azul claro, graças à calça jeans que as acompanhava na máquina de lavar. (Sim, papai e mamãe sempre me deram boa vida!) Lá também tomei meu primeiro porre. Em fevereiro daquele ano, Marce, Esteban, Caro, Rodrigo e Renzo entraram comigo no apartamento. E não saíram mais da minha vida.

Três semanas depois, em novembro, com o coração aos pulos, desço do táxi em Buenos Aires, de madrugada. Toco o interfone e abraço a Caro, às lágrimas. Meu cúmplice e mentor da surpresa internacional, o peruano Renzo, já havia chegado. Doentes de saudade, resolvemos tomar um avião e surpreender os argentinos, que não víamos desde agosto. Simples assim, como se fôssemos dois cariocas combinando uma ida à praia no Rio. Marce, incrédula, tropeçou em nós dois na rua, arrancada de um jantar às pressas pela Caro, que inventou um problema urgente para convencê-la a aparecer na sua casa à 1h.

No dia seguinte, Esteban chegaria de Mendoza para uma prova, igualmente desavisado sobre os visitantes. Caro e Marce esperavam-no na plataforma da rodoviária. Mas quem elas viram primeiro, descendo de outro ônibus, foi o Rodrigo. O gaúcho foi laçado para a aventura na fronteira, recém-chegado da Europa. Ganhou um grito de alegria da Caro e um abraço trêmulo da Marce, assombradamente emocionada com a abrupta reunião da turma.

De lá para cá, sigo meus Fab Five pela América Latina: com eles já mergulhei no Caribe, subi o Wayna Picchu para ver as mais famosas ruínas incas e descobri a montanha arco-íris de Purmamarca. Através deles, conheci mais gente interessante. Por eles, transformo em virtual a distância real que nos separa.

domingo, 8 de junho de 2008

A matemática dos olhos verdes

Essa é de um amigo sedento que costuma matar sua sede nas paisagens da costa fluminense.

- Ele chegou! - anunciou a assessora.

A secretária de Admininstração suava. O terror das prefeituras já estava na recepção. O órgão externo responsável pelo controle das contas não teve pena daquele pequeno município litorâneo e mandou seu inspetor mais rígido para virar do avesso planilhas, folha de pagamento, licitações. A secretária já sabia que nas finanças da cidade 2 + 2 nem sempre davam 4. E enxugava a gota gorda de suor que escorria pelo pescoço.

- Bom Dia. Quero ver todos os processos de licitação de janeiro a dezembro deste ano - ordenou o inspetor.

- Mas é muita papelada. O senhor não prefere conferir um mês de cada vez? - disse a secretária.

- Não. Quero tudo nessa mesa em meia hora.

Em meia hora quilos de papel começaram a entrar pela sala em um carrinho desses de transportar caixas. Eram tantos processos que nem dava para ver quem em estava atrás daquela pilha. Quando o 0001/2007 baixou na mesa deu para ver os primeiros fios de cabelo louro. Ao descarregar o 0002/2007, surgiram olhos cor de esmeralda emoldurados por cílios imensos. No 0005/2007, os peitos quase pularam do decote em cima do inspetor. Aquele baixinho barrigudo não ficaria imune a Ana Maria. Não havia funcionário que não salivasse ao vê-la desfilar na repartição.

- O senhor deseja mais alguma coisa? - perguntou a funcionária, bem de-va-ga-ri-nho, apoiando os cotovelos na mesa.

- Não - disse ele, que baixou os olhos e continuou na sua fúria investigadora.

Passou o primeiro, o segundo, o terceiro dia e nada. O cara era uma rocha. Nada o desconcentrava. Pior, notaram que quando Ana Maria entrava na sala a sanha inquisidora do inspetor aumentava. O plano de mandar a gostosa distraí-lo foi por água abaixo.

No quarto dia, Ana Maria não apareceu. Voltou para sua função. O fiscal não parava de fazer anotações e pedir xerox dos processos. Crescia a certeza de que a prefeitura seria condenada. A secretária resolveu escalar logo um advogado para acompanhá-lo. Foi decidido que Adriano seria a sombra do inspetor. Na quinta-feira, ele apareceu com a folha de pagamento de junho.

- Bom dia - saudou o advogado, um jovem alto, de cabelos negros e olhos verde-claros, realçados pela pele morena.

- Bom dia! - respondeu o inspetor, numa simpatia jamais vista.

A inspeção ainda demorou bastante. Mas tudo mudou depois daquela quinta-feira. O inspetor virou amigo da secretária. Em vez de caretas, distribuía sorrisos. Em seu relatório, concluiu que as contas do município eram transparentes, claras... como os olhos de Adriano.