quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

Fogo na cruz

Era a hora de renovar o espetáculo da Paixão de Cristo de Nova Jerusalém. Na cidadezinha de Fazenda Nova, no interior de Pernambuco, o comerciante Epaminondas Mendonça cismou que um grande teatro ao ar livre, o maior do mundo, daria novo gás à economia local contando a história da morte e ressurreição de Jesus. O ano era 1967. E ele estava certo. Trinta anos depois, patrocínio de multinacional, público de 70 mil pessoas, mas... estava faltando alguma coisa. O mesmo Pôncio Pilatos e o mesmo Cristo batiam ponto ali há 18 anos. Maria era mais nova na casa: 15 anos de via-crúcis.

O que fazer para surpreender o público se não dava para adaptar o final? Nem pensar em experimentalismos, que a platéia, católica, não ia tolerar de jeito nenhum.

A resposta veio da novela O Rei do Gado. Do sucesso global saiu quase todo o novo elenco, e sob o chapéu do cowboy-playboy Marcos Mezenga estava a estrela principal. Fábio Assunção de cabelo comprido era O Jesus Cristo Superstar.

A recepção à novidade foi calorosa. Acompanharam, contritos, a traição de Judas em um palco. A luz se apaga e o lanterninha guia todos para outro cenário grandioso. A luz se acende, o Pilatos do Jackson Antunes (o Charles Bronson brasileiro) lava as mãos. Apaga e acende, via-crúcis. Luz de novo, a crucificação.

Aí, a temperatura subiu pra valer. De barba cerrada e coroa de espinhos, Fábio Assunção trocou a túnica que tudo escondia por aquele trapinho que tapava o básico. Foi quando a galera feminina deixou a fé de lado e se transportou para um show do Wando. Choveram calcinhas e sutiãs aos pés da cruz. E com o som dos amplificadores abafado pelos gritos de "lindoooooo", "gostooooooso", o galã olhou para o céu, concentrou-se e rogou:

-- "Pai, perdoai-os, eles não sabem o que fazem".