sábado, 12 de abril de 2008

Perfil grego, cara-de-pau inglesa



Toda história tem pelo menos duas versões. E a cara-de-pau impera na hora de ir contra todas as provas e querer fazer do lado torto, o certo. Veja só a briga entre Inglaterra e Grécia pelas esculturas do Partenon.

Em 2004, visitei a Acrópole e o British Museum com intervalo de menos de um mês. Em Atenas, tentava recompor com a imaginação e um guia as muitas peças que faltavam no Partenon. Se o templo fosse gente diria que ele comeu não o pão que o diabo amassou, mas o que ele vomitou. Construído no século V antes de Cristo, foi bizarramente convertido em paiol pelos turcos quando eles mandavam lá. Virou alvo militar, óbvio. Foi bombardeado e despedaçado em 1687.

Essa foi sua primeira grande destruição. Culpa dos venezianos. A segunda, de acordo com o governo grego, tá na conta do inglês Lord Elgin. Entre 1801 e 1810, ele, embaixador no Império Otomano até 1805, carregou para sua terra metade das esculturas ainda de pé na Acrópole. Em Atenas, lê-se e ouve-se os maiores impropérios contra o sujeito. Em Londres, ele é o cara. Se não fosse por ele, a Humanidade não poderia admirar detalhes daquela maravilha. Eles teriam virado pó pela ação do tempo, da chuva e da poluição. Isso tá escrito numa plaquinha em galeria no térreo do British Museum.

Com todo o óleo de peroba que há na Terra, o redator da homepage do museu enumera e rebate todas as acusações contra o diplomata. "Lord Elgin roubou a coleção". Nããããão, de jeito nenhum. Os turcos autorizaram. "Lord Elgin conseguiu as peças com suborno e pressões". Imagina?! Dar presentes para autoridades locais era costume na época e "os relacionados com as esculturas" só custaram 600 libras. "Lord Elgin vendeu tudo para o governo britânico". "Isso não é verdade". Ele estava arrasado financeiramente, coitado, e pediu 73600 libras para cobrir os custos de anos de dedicação à cultura grega. Foi julgado e absolvido. Pelo Parlamento Britânico. Em troca, teve que levar para casa, rindo, menos da metade do que pediu: 35 mil libras.

Conforme o texto avança, o redator veste ainda mais a camisa para defender porque raios os "mármores do Elgin" -- as obras de arte gregas passaram a ser conhecidas assim na Inglaterra -- estão melhor em Londres que em Atenas. E se supera no argumento definitivo: "A Grécia moderna não poderia ter embaixador melhor no mundo que as esculturas do Partenon no British Museum, bem expostas, num museu de entrada grátis, onde são admiradas por mais de 4,6 milhões de pessoas por ano".


o grego

e vídeo que mostra a galeria com parte do acervo "do Elgin" no British Museum.